Uma velha frase já dizia: “a
expectativa é a mãe da frustração”. Eu gosto de completar esta frase lembrando
que a idealização é sua avó. Mas o que idealização tem a ver com frustração? E
mais: o que podemos fazer em relação a ela?
Todos nós experimentamos, ao
longo da vida, inúmeras situações em que nos sentimos frustrados. Via de regra,
a frustração é um sentimento gerado pela impossibilidade de se obter algo
anteriormente pretendido – ou seja, um alvo de nossas expectativas. Isso se
aplica desde a mais tenra infância, quando somos bebês, até o auge da vida
adulta. Observamos crianças se sentindo frustradas quando, por exemplo, desejam
intensamente um brinquedo e este não lhe é concedido. Também vemos adultos
frustrados por não terem conseguido uma promoção no trabalho. Ninguém está
imune a sentir-se frustrado, mas é nítido que existe uma diferença bem clara
entre a maneira de um e de outro reagir emocionalmente à frustração – a chamada
tolerância.
Podemos dizer que ao longo das
experiências de frustração que um indivíduo tem, sua tolerância vai sendo
desenvolvida e ele consegue lidar relativamente bem com as situações causadoras
de frustração. Este é o motivo pelo qual uma criança chora por causa do brinquedo
que lhe é negado, enquanto o adulto consegue tolerar com mais tranqüilidade as
situações adversas pelas quais atravessa. Ou seja, além do estado emocional, a
maneira de um indivíduo expressar sua frustração também vai evoluindo com o
tempo.
Esta seria a teoria, ou pelo
menos o que seria válido para a grande maioria das pessoas. Entretanto, observamos
com alguma frequência que existem pessoas que apresentam uma baixíssima
tolerância à frustração, e uma expressão inadequada da mesma. É o exemplo de quem
sofre tão intensamente quando não consegue algo que chega a deprimir; ou que
briga, que grita, que não admite ser contrariado ou aquela pessoa que vai “até
as últimas conseqüências” para ter o que quer. Quanto menor a tolerância à
frustração de uma pessoa, menor a sua capacidade de aceitar as situações e se adaptar a elas. E o que determina este grau
de tolerância à frustração é, via de regra, sua história de vida e as
experiências vivenciadas.
Por que a tolerância é tão variável?
De maneira geral, podemos citar 2
grandes motivos para que o nível de tolerância à frustração varie tanto de
pessoa para pessoa: o histórico de vida,
e a tendência à idealização no
estabelecimento dos objetivos. É importante ressaltar que estes dois fatores
interagem entre si, um retroalimentando o outro; entretanto, por fins
didáticos, vamos falar sobre cada um deles separadamente.
O histórico de vida refere-se com
o quanto de privação um indivíduo já experimentou ao longo de sua história. Pode
ser que uma pessoa tenha experimentado tantas privações na vida que uma única
oportunidade de obter algo desejado é encarada com imensa expectativa. Como
quando alguém que sente sede há tanto tempo que, quando vê um copo de água,
avança sobre ele sem pensar em nada mais. Ou, na extremidade oposta, pode ser
que outra pessoa nunca tenha tido que “passar sede”, e por isso não está
acostumada a lidar com o desconforto de sentir necessidade ou desejo de algo.
De maneira geral, estas duas
pessoas hipotéticas têm mais chance de lidar mal com a frustração, ou seja, de
possuírem menor tolerância. Por outro lado, quando as experiências de
frustração ao longo da vida não foram nem demais, nem de menos, mas
relativamente equilibradas e bem orientadas pelas pessoas significativas que
estiveram próximas (pais, professores, parentes), um indivíduo estará
razoavelmente capacitado a lidar com o desconforto emocional causado pela
frustração.
A expectativa criada sobre uma
determinada situação está diretamente ligada ao nível de frustração
experimentado – motivo pelo qual é tida como “mãe” da frustração. O grau de
privação, como dito acima, pode ser um fator de ligação, mas o mais comum é que
esteja havendo uma forte idealização,
ou seja, o ato de fantasiar ou planejar algo de maneira utópica ou muito
distante da realidade. Quanto mais distante da realidade um objetivo for, mais
difícil fica de alcançá-lo, ou pelo menos o tempo que levará para isso será,
sem dúvida, aumentado, ou os esforços terão de ser redobrados. E neste trajeto
entre o desejo e a obtenção, a frustração começa a dar as caras.
Grosso modo, portanto, o nível de
frustração é diretamente proporcional ao grau de idealização que uma
expectativa contém. Isso quer dizer que, para evitar a frustração, deve-se
diminuir a idealização. Eis porque tantos programas de organização e
planejamento falam em metas reais e
mensuráveis – quanto mais realista uma meta é, mais possível ela se torna.
Como lidar melhor com as situações que nos trazem frustração?
Diante do exposto, podemos concluir
que, para diminuir as chances de sentir-se frustrado, o caminho mais rápido é a
readequação de suas expectativas. Neste contexto, é sempre útil a reflexão: “neste
objetivo ou desejo que estou lidando, estou sendo realista sobre o que pretendo
alcançar?”. Muitas vezes, a simples consciência a respeito da importância
de traçar metas cuidadosamente já é o suficiente para que a empreitada seja
mais bem sucedida.
Mas vezes outras há em que,
estando fora de nosso controle, não conseguimos evitar nos sentirmos
frustrados, magoados ou mesmo com raiva daquilo que não pudemos obter. Isso
vale para quase tudo: a promoção que o chefe negou; uma viagem que não deu
certo; uma briga com o marido; um restaurante que deixou a desejar. Diante
destas situações, a frustração tende a aparecer, e é importante que saibamos
dar vazão aos sentimentos sem nos prejudicarmos ainda mais.
A expressão da frustração também
está diretamente ligada à intensidade da emoção vivenciada, porém tem mais
relação com o repertório comportamental
do indivíduo do que propriamente com a dimensão da experiência vivida. Podemos
substituir a palavra repertório por histórico, ou padrão. Uma pessoa acostumada a reagir agressivamente a episódios
de frustração carrega em si a tendência a agir desta exata mesma maneira nas
experiências subseqüentes que vivenciar.
Um comportamento repetido por
diversas vezes torna-se um hábito, e os hábitos comportamentais são, de maneira
geral, bastante estáveis ao longo do tempo. Eles são consolidados ao longo da
vida conforme o grau de sucesso deste comportamento – se sua maneira de reagir
a algo te traz conforto, alívio ou mesmo atenção, é bem provável que você
continue a agir assim no futuro.
Isso explica porque algumas
pessoas, quando frustradas ou chateadas, comem, bebem, gritam ou ligam para um
amigo. Comer, beber, gritar ou falar com alguém traz conforto ou alívio da
sensação ruim, e elas permanecem agindo assim enquanto este comportamento
funcionar.
Entretanto, há formas que
“funcionam”, mas que são bastante desadaptativas – alguém que sempre consegue
algo “no grito”, ou passando por cima das pessoas, ou que bebe em demasia,
fatalmente uma hora sentirá os efeitos nocivos deste comportamento. Ela pode
acabar distanciando as pessoas, criando inimigos, tendo problemas de saúde, ou
sentindo tanta raiva que passa a se incomodar com a própria maneira de agir.
Diante deste tipo de cenário, é
útil pensar em outras formas, mas adaptativas, de lidar com a frustração. Neste
sentido, praticar a aceitação é a
peça chave do negócio.
Tolerando a frustração
Aceitar uma situação significa, principalmente, parar de lutar
contra – e portanto, tolerar o
desconforto que está sendo vivenciado, tentando encontrar maneiras alternativas
de lidar com ele – tentando encarar a situação por outro prisma, conversando
com pessoas que já passaram pela mesma dificuldade, preparando-se melhor para
uma futura tentativa. Normalmente, o próprio tempo também ajuda a ir
dissolvendo o mal-estar causado pela frustração, e evitar adotar atitudes
impulsivas ou imediatistas já pode ser bastante benéfico para quem tem
dificuldade em aceitar uma situação desfavorável.
Reagir de maneira alternativa à
frustração significa, em última análise, treinar justamente a tolerância – e
assim romper um círculo vicioso: quanto mais treinamos a aceitação, mas
tolerantes nos tornamos, e quanto mais tolerantes somos, menos frustrados nos
sentimos e menos dificuldades teremos em aceitar e nos adaptar às situações
adversas.
2 comentários:
Gostei muito do texto. Acredito que quanto maior o desejo por algo maior a frustração quando não há sucesso em obtê-lo e que uma das dificuldades de muitas pessoas é saber a hora certa de desistir/substituir o objeto de desejo. Também existe uma grande diferença em se frustrar por não conseguir um cargo muito almejado e não conseguir realizar um desejo mais existencial como ser mãe, por exemplo.
Com certeza, Lílian! Esse seu comentário me leva a pensar nas diferenças existentes entre ACEITAR e se RESIGNAR. Creio que a aceitação nem sempre quer dizer desistir, as vezes como você disse, substituir ou tentar algo novo pode ser a saída. Quantas mulheres, depois de sofrer o luto de não poderem ser mães, optam pela adoção? Desta forma, percebem que podem sim ser mães, mas terão que tolerar a frustração de não ficarem GRÁVIDAS, o que já é algo bem diferente.
Obrigada pelo seu comentário, e volte sempre!
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