quarta-feira, 27 de novembro de 2013

"PENSANDO BEM..."


O papel das distorções cognitivas em nossos erros de julgamento.

texto publicado no site "Psicologia Explica" - leia aqui!





Que atire a primeira pedra quem nunca se pegou, passado o furacão, revendo seus próprios pensamentos e chegando à conclusão de que “estava de cabeça quente” – uma forma de dizer que não estava pensando direito, ou então que concluiu coisas precipitadamente por conta do calor das emoções.

Todos nós fazemos isso de vez em quando: não pensamos direito. Com isso, quero dizer que uma das coisas mais comuns no funcionamento humano é a distorção de pensamento, ou distorção cognitiva. Esse tipo de mecanismo mental é o principal responsável pelos erros de interpretação, mal-entendidos e conclusões precipitadas, e ocorre em nossas vidas com uma frequência impressionante.

Quando um pensamento está distorcido, ele tende a gerar emoções “negativas”, ou seja, as que provocam desconforto e que normalmente conduzem a um tipo de atitude pouco adaptativa (em geral, comportamentos impulsivos, tendenciosos e pouco flexíveis). Sob a batuta de um pensamento distorcido, seguimos por uma via de conduta igualmente distorcida, o que acaba por retro-alimentar uma situação de possível conflito, ampliando o desconforto emocional.

Sempre que penso em distorções cognitivas, me lembro daquela velha piadinha sobre o homem que viajava numa estrada à noite, quando o pneu do carro furou. Ele ficou desconsolado porque justo naquela semana tinha retirado o macaco do porta-malas, e quando viu uma casinha no alto da montanha, sentiu uma pitada de esperança – iria até lá pedir ajuda. Acontece que, no caminho, ele começou a pensar... “Com certeza vou atrapalhar essa pessoa, ela vai me tratar mal e me achar muito inconveniente! Mas se ela for egoísta a esse ponto de negar ajuda a um pobre coitado eu vou ficar realmente furioso! Porque isso não se faz! Só porque passa da meia-noite não quer dizer que eu não possa pedir ajuda, que absurdo!” ... e assim ele foi pensando até o alto da montanha, muito nervoso e já irritado. Quando tocou a campainha e um senhor abriu a porta, ele deu um soco na cara do homem e gritou “Seu egoísta, isso é para aprender a nunca deixar alguém na mão!”.

Por mais engraçadinha que seja a piada, quem nunca passou por isso? Quem nunca fez previsões de futuro altamente equivocadas, se enganou em um julgamento, meteu os pés pelas mãos? Não precisamos nos restringir às piadas, pois os exemplos cotidianos são numerosos. Seu chefe o chama, repentinamente, em sua sala, e você já logo sua e treme todo pensando que será demitido. Alguém olha feio para você na rua e pronto: você já quer tirar satisfações com o sujeito. Seu namorado não atende seu telefonema e você já fica furiosa, imaginando sabe-se lá o que ele está fazendo que não quis te atender.

Em todas estas situações, podemos perceber que existe uma avaliação mal feita da realidade, uma interpretação parcial ou tendenciosa, que não leva em consideração as variáveis múltiplas do ambiente. Esta avaliação equivocada é a principal causa de uma distorção cognitiva, mas também percebemos que outras coisas estão em jogo, como crenças disfuncionais ou mal-adaptativas sobre o mundo, o outro ou até sobre si mesmo – que funcionam mais ou menos como um alicerce básico que irá orientar todo o seu padrão de pensamento. É o que acontece, por exemplo, com pessoas eternamente desconfiadas de tudo e todos: com uma crença básica de que o mundo (e as pessoas) são pouco confiáveis, suas interpretações das situações tenderão a seguir o mesmo princípio.

Identificar uma distorção cognitiva é o primeiro passo rumo a corrigi-las e, portanto, ter reações mais adequadas diante das diversas situações conflituosas que marcam nossas vidas. E como já diz a velha frase, “quem não sabe o que procura não reconhece quando encontra”, e é por isso que selecionei, logo abaixo, as distorções cognitivas mais comuns (e nocivas!) do nosso cotidiano.

CATASTROFIZAÇÃO - O célebre “fazer tempestade em um copo de água”! Quem catastrofiza acha que, entre várias possibilidades, a pior de todas é a que irá acontecer. É o caso do exemplo acima, em que um simples chamado do chefe vira uma possibilidade de demissão. Normalmente, a catastrofização surge de uma confusão entre possibilidade X probabilidade: considerar algo possível de acontecer como altamente provável.

POLARIZAÇÃO (“tudo ou nada”) - Outra distorção bem clássica, a polarização é um modo de pensar em que as coisas se definem de maneira muito extrema ou radical: ou uma coisa é boa, ou é péssima; ou uma pessoa te ama, ou ela te odeia; você é um sucesso ou então um completo fracasso. Essa forma “8 ou 80” de pensar é especialmente nociva pois desconsidera todos os meios-termos das situações cotidianas, todos os tons de cinza existentes entre o branco e o preto.

ADIVINHAÇÃO - Apesar de trabalharmos o tempo todo com previsões de futuro (“acho que vai chover, melhor levar um guarda-chuva”; “lá pelas 8h ele deve estar chegando”), precisamos de uma avaliação bem feita da situação para podermos prever razoavelmente bem algum desfecho. Quando esta avaliação é parcial ou mal executada, ou pior, se ela é conduzida basicamente pelas nossas emoções, acabamos fazendo previsões equivocadas, o que geralmente causa surpresa ou frustração. Se você considerar apenas sua insegurança e nervosismo na hora de fazer uma apresentação no trabalho, por exemplo, provavelmente fará previsões do tipo “vai dar errado”, “vou ficar tão nervoso que vai dar branco” etc, o que provavelmente comprometerá seu desempenho – causando justamente o que você teme que aconteça!

LEITURA MENTAL - Essa é bem clássica – no dia-a-dia, todos brincamos de telepatia, achando que sabemos o que o outro está pensando e concluindo mil coisas com base nisso. Às vezes, uma simples expressão facial mais difícil de discriminar pode virar uma leitura mental daquelas: “ela não gostou do que eu disse”, “falei besteira”, “com certeza ele vai me demitir agora!”. Dificilmente “lemos” pensamentos bacanas. Isso não é curioso? O que normalmente acontece é que associamos a situação aos nossos próprios sentimentos de base – nossa insegurança, medo, etc., que funcionam como lentes através das quais olhamos a situação.

HIPERGENERALIZAÇÃO - “Nenhum homem presta”; “toda sogra é chata!”, “comigo nada dá certo!”. Reparou nas palavras radicais usadas nesses exemplos? “Nenhum”, “Todos”, “Sempre”, “Nunca”, “Nada” etc, são palavrinhas básicas de quem tende a generalizar uma situação. Tomando o todo pela parte, pegamos uma situação conflituosa e ampliamos nossa interpretação para todas as outras (até as que não conhecemos!). Então TODA sogra é chata, até a que você ainda não conheceu; e NENHUM homem presta, muito embora você não tenha conhecido todos os homens do mundo. A hipergeneralização é bastante danosa pois já incute em nós uma pré-disposição negativa em relação a situações futuras, não dando chances de que as coisas se revelem de maneira diferente (e se a sua futura sogra for super legal??).

PERSONALIZAÇÃO - “Minha culpa, minha culpa!” – esta poderia ser a máxima de quem personaliza tudo. Tudo é por sua culpa, ou tem a ver com você, ou você interferiu, ou causou algo. Até o caixa do supermercado está de cara feia porque você fez alguma coisa errada, só pode ser. Nenhuma chance de isso ter a ver com outras coisas – só com você! Na personalização, nós ignoramos qualquer outra variável e depositamos em nós a responsabilidade pelo evento. Como aquele amigo que não atendeu a sua ligação: ele só pode estar chateado com você! Não existe nenhum outro fator que o leve a isso, ele não te atendeu porque não quis falar COM VOCÊ!

DESQUALIFICAÇÃO DO POSITIVO – Essa distorção é talvez a que gera as formas mais injustas de ver as coisas, pois por conta dela, elementos bons da situação são desconsiderados ou atenuados até quase não fazer diferença. Então se você é promovido no trabalho, ao invés de ficar feliz por isso, você pensa “Demorou, né? Era o mínimo que eu podia fazer” – e sua promoção vira uma coisa qualquer. Se você ganha flores do marido no aniversário de casamento, e pensa “Com certeza foi a mãe dele que o lembrou da data!”, nem de longe ficará feliz pelas flores. A desqualificação do positivo é como uma peneira, na qual nada de bom passa, ou se passar, é banalizado ou sem seu devido valor.

Existem outras distorções cognitivas além das supracitadas – todas formas de variações destas mais básicas, e todas com o mesmo mecanismo comum: uma forma tendenciosa e uma avaliação parcial da situação. Em toda distorção cognitiva, observamos uma forma de interpretar a realidade que não leva em consideração todas as variáveis existentes, e por isso mesmo é uma avaliação incompleta e equivocada da realidade.

Da mesma forma, todas são igualmente nocivas por gerar emoções “negativas” e nos pré-dispor a formas de nos comportar igualmente tendenciosas, impulsivas e injustas, o que tende a piorar a situação e a gerar mais desconforto.

Portanto, diante de uma situação em que observamos uma carga emocional muito intensa ou uma mudança súbita de humor, é bom pararmos e observarmos, nos questionando: “Esta é uma forma justa de ver esta situação? Ou existe uma outra forma de vê-la? Estou desconsiderando alguma coisa importante?”. Nestas horas, pensar mais um pouquinho ou até pedir a opinião de outras pessoas pode ser bastante importante – existem muito mais formas de enxergar a mesma situação do que supõe a nossa vã filosofia.


quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Medo ou Fobia?



Eu já escrevi antes, aqui no blog, do problema que temos hoje em dia em usar uma terminologia patológica para sentimentos comuns do cotidiano, como chamar toda tristeza de depressão e toda ansiedade de Pânico. Questão puramente de pouco conhecimento, esse tipo de ocorrência se torna especialmente complicada quando a patologia realmente está presente e não é levada a sério.

É o caso, muitas vezes, do que acontece em relação às fobias e ao medo normal Vs patológico. Porque medo, é um fato, todo mundo tem. Mas todo mundo MESMO. Mas quando saber que é a hora de levar aquele medo um pouco mais a sério e reconhecê-lo como ele realmente é: uma fobia? Será que esse medo merece tratamento?

Quando um tipo de sentimento é muito presente no nosso dia a dia, costumamos dizer que ele é normal. Eu já prefiro dizer: é COMUM, mas não necessariamente normal. Por exemplo: ter medo de assalto é bem comum (muita gente tem), mas tem medo de assalto que não é normal (se você está dentro de casa e não tem nenhum ladrão ou sinal de assalto, por exemplo).

A diferença entre normal e patológico é o que vai, via de regra, orientar o nosso encaminhamento em relação a um medo. O que precisa de tratamento é o medo ANORMAL, ou PATOLÓGICO. E alguns medos não devem nunca ser eliminados, pois são funcionais e vitais para a sobrevivência do indivíduo.

Imagine a cena: você está na beira de um penhasco e não sente MEDO NENHUM. Nem um friozinho no estômago, nem uma tensãozinha no corpo. Isso é normal? O que acontece com um organismo que está super “zen” na beira de um penhasco? Ele apenas fica por ali... olhando a vista, meditando, lixando as unhas... e o tempo que está exposto à altura aumenta, exponencialmente, sua chance de cair! Já um organismo que sente medo irá, instintivamente, se afastar do perigo, se mantendo vivo e seguro.

Este é um exemplo típico de um medo “normal” – além de normal, ele é o que chamamos de filogenético, ou seja, é próprio da nossa espécie e vem sendo, ao longo dos séculos, selecionado naturalmente no processo evolutivo do homem (indivíduos que tem medo de cair do penhasco sobrevivem mais e reproduzem mais). Assim como o medo de altura, outros medos também são explicados por esta característica de serem grandes protetores do indivíduo. Um outro exemplo bastante comum é o medo de animais pequenos, como insetos, vermes etc (um desses bichinhos pode entrar em nossas narinas e nos asfixiar. Reza a lenda que o medo que o elefante tem do rato também segue essa linha, pois o rato poderia entrar em sua tromba e asfixiá-lo).

O medo tem característica, portanto, FUNCIONAL: ele ajuda o indivíduo a agir de maneira adequada, o preparando para um desfecho mais seguro e previsível. Quando você está andando pela rua e vê uma pessoa suspeita com uma arma na mão, você muda de lado da calçada, entra numa loja, sai correndo. O medo que você sentiu te ajudou a se comportar de um jeito bom, e você se protegeu.

Muitos exemplos do nosso dia a dia podem ser analisados à luz dessa ideia de funcionalidade: o medo súbito quando seu chefe te chama na sala dele com cara de bravo pode ser explicado assim: você acha que ele vai te demitir, e isso pode significar problemas financeiros, e por consequência escassez de alimento, que é outra coisa fundamental para sua sobrevivência.

Podemos generalizar dizendo, portanto, que o medo é uma resposta de um organismo frente a uma situação de ameaça. Até aqui, tudo bem.

Mas e quando o medo não está relacionado a nenhuma ameaça clara? E se o seu medo for, por exemplo, de elevador? Nenhum animal das cavernas teve medo de elevador. Nem cachorros são ameaçadores 100% das vezes, e como explicar que tem gente que AMA cachorros, e gente que só de ver um cachorro já começa a chorar e suar? Alguma outra coisa está acontecendo aí... porque estamos fora do âmbito da sobrevivência da espécie. Este é um medo injustificado, ilógico, ou em relação ao qual você pode ter uma reação absolutamente desproporcional.

Se você vê um rottweiler correndo e rosnando na sua direção, esse medo se justifica. Mas por que então ter uma reação de medo diante de um filhotinho de poodle? E o elevador? Ele não rosna nem morde. E você simplesmente não entra num elevador.

Considerando essas ideias, podemos começar a distinguir bem claramente o medo normal do medo patológico, ou fobia: o medo patológico não está ligado a uma ameaça necessariamente real, e é caracterizado, via de regra, por um comportamento EVITATIVO em relação ao objeto de medo. A evitação de coisas temidas é funcional quando o medo é normal – entretanto, quando o medo é patológico, o que se observa é que essa evitação é, a um mesmo tempo, provocada pelo medo, mas também um fator de manutenção do medo.

Vamos exemplificar:

Uma pessoa que tem fobia de elevador, ao se deparar com uma situação em que precisa pegar o elevador, sente muito medo e vários sinais de ativação autonômica aparecem em seu corpo (suor, tremor, taquicardia etc). Diante desse mal estar horrível, ela resolve subir de escada e, assim, se livra de sua angústia. Mas toda vez que ela se depara com essa situação, esses sinais voltam. Ou seja: o problema continua, apesar dela se esquivar sempre.

O comportamento de evitar a situação produz alívio. E o ser humano busca sempre o conforto e o alívio. O que ocorre é que, em pouco tempo, sua ansiedade é REFORÇADA pelo comportamento de evitação: toda vez que esta pessoa evita o elevador, a ansiedade vai embora, e assim ela nunca aprende a lidar com sua ansiedade de uma maneira que não envolva fuga e esquiva. Cria-se um padrão que irá conduzi-la nas situações em que sentir medo e ansiedade: é só “fugir”. Com o tempo, a pessoa começa a fugir sem nem ao menos estar em contato com a situação – ela passa a fazer de tudo para sequer esbarrar na possibilidade de sentir medo de novo.

Percebe-se, portanto, que o que em situações de medo normal é bastante funcional (se vir um rottweiler bravo por perto, não fique dando bobeira!), em situações de medo fóbico essa evitação acaba por cristalizar o problema e por causar uma restrição no repertório comportamental desse indivíduo, criando problemas para ele. Imaginem subir 20 andares de escada? Ou não sair de casa porque você pode se deparar com um cachorrinho na esquina?

Portanto, uma diferença FUNDAMENTAL entre o medo normal e o patológico é, bem como em outras situações de doença mental, o nível de PREJUÍZO e de sofrimento que o indivíduo tem por causa daquilo. Se você não gosta de baratas, mas sua vida segue normal, você dificilmente precisa de um tratamento. Mas se você evita lugares, sente medo o tempo todo, não vai na casa de amigos, abandonou o trabalho (só alguns exemplos mais dramáticos) porque teme cruzar uma barata no caminho, bingo: você tem uma fobia.

Ao conversar com uma pessoa que apresenta algum tipo de medo patológico, é frequente encontrar algum episódio de início do problema. Por exemplo, um arranhão na cara aos 5 anos e hoje o adulto não pode ouvir nem o “miau” de um filhote de gato. Mas, não raro, um indivíduo pode não ter nenhuma história traumática com o objeto de medo. Isso pode acontecer pelo que chamamos de modelação (observação de outras pessoas significativas tendo reações fóbicas, com imitação) ou ainda por condicionamento.

O medo condicionado é um medo aprendido e que pode ser secundário a objetos primários de medo. Situações aversivas têm um poder de generalização que pode transportar para outros objetos ou elementos a emoção de medo sentida anteriormente. No vídeo abaixo, temos uma das primeiras experiências de medo condicionado por pareamento a estímulo aversivo. Quando duas coisas ocorrem simultaneamente, e uma delas é muito aversiva, a outra pode passar a carregar a mesma carga de aversividade.


Atualmente, dividimos as fobias em 3 grandes categorias: as específicas, a social (hoje chamada de Ansiedade Social) e a agorafobia (fobia a locais abertos onde a fuga para um local seguro é dificultada). Todas as 3 apresentam o mesmo funcionamento: resposta emocional desproporcional a algum elemento, evitação do mesmo e consequente restrição comportamental.

Isto posto, suponhamos que você descobriu que o que você tem não é frescura, nem xilique, nem uma coisa bizarra, você tem uma fobia. Sim, você deve levá-la a sério. Quem tem uma fobia tem mais pré-disposição a desenvolver outras fobias ou Transtornos Ansiosos, o que já é mais do que motivo para procurar um tratamento.

O tratamento padrão-ouro (o mais eficiente) atualmente é a Terapia de Exposição, uma técnica comportamental que se baseia no fenômeno da habituação para a eliminação da fobia. A habituação é um processo através do qual um organismo, exposto por tempo prolongado à situação aversiva (ou seja, sem resposta de esquiva), deixa de sentir ansiedade e os sinais de ativação autonômica deixam, após algum tempo, de ser emitidos. Este é um fenômeno natural do organismo, que vai “relaxando” à medida que vai identificando que o perigo não está afetando sua integridade física / pessoal.

Na Terapia de Exposição, o paciente será gradativamente confrontado com seu medo, até que a resposta de ansiedade e esquiva desapareça por meio da habituação. Isso significa, necessariamente, que é preciso CONFRONTAR a situação temida, e que a ansiedade e o medo estarão presentes. Entretanto, o procedimento é elaborado de maneira a que o paciente seja sempre exposto a um nível mínimo de ansiedade, indo aos poucos ganhando confiança e sentindo que pode adquirir mais controle sobre seu medo.

A Terapia de Exposição é uma técnica detalhada e específica, e deve ser conduzida por um profissional treinado e preparado para as dificuldades do processo. Sim, existem várias dificuldades – a própria ideia de ficar exposto ao objeto fóbico já é, muitas vezes, o suficiente para a pessoa abandonar o tratamento antes mesmo de começar, mas o profissional qualificado cuidará de elaborar um processo compatível ao nível de tolerância do paciente.

A Exposição é extremamente eficiente. Portanto, se você tem ou conhece alguém com alguma fobia, não deixe de procurar ajuda ou de incentivar a pessoa a procurar tratamento. As fobias roubam qualidade de vida, podem levar à Depressão, e são hoje um problema tão comum que muitas vezes são subdiagnosticadas por anos à fio, levando a mais e mais sofrimento.



quinta-feira, 19 de setembro de 2013

PORQUE SOU PSICÓLOGA



Uma pergunta que eu ouço muito é: “mas por que é que você quis ser psicóloga??”

Eu acho uma pergunta bem interessante, porque normalmente ela é seguida de alguns comentários como: “como você aguenta ouvir problema o dia inteiro?”, “deve ser tão pesado!”, “é só sofrimento!”. E bom, eu não posso dizer que não é, em parte, um pouco disso tudo. E eu sei muito bem que, normalmente, essas são razões mais do que suficientes para alguém nem pensar em fazer Psicologia.

Eu fico um pouco sem graça quando começo a responder essa pergunta porque, logo de cara, eu quero muito explicar que eu não sou sádica e nem masoquista! Não, eu não gosto de ver o sofrimento alheio. E é claro que mexe comigo, é claro que às vezes é desconfortável ouvir tanta coisa pesada.

Mas sim, de certa forma, eu GOSTO. Não do sofrimento do outro. Mas do que essas vivências doloridas trazem de oportunidade de crescimento. Porque esse é o cerne do que eu considero o meu principal propósito ao ser psicóloga: propiciar CRESCIMENTO.

É como se ouvir as coisas doloridas fosse uma parte do caminho bem pedregosa, mas que leva a um lugar incrível. E é por botar MUITA FÉ nisso que eu me disponho a atravessar essas “trevas” junto com quem vem me procurar, por mais pesado que seja, por mais pedras no caminho que tenha.

Sim, é um cotidiano difícil. Mas tem recompensas maravilhosas. No fundo, tudo o que eu quero ver é uma evolução acontecer, e é claro que tem um sabor incrível pensar que eu pude ajudar um pouquinho nisso. É ser “narcisista”? Talvez seja um pouco. Talvez todo psicólogo queira brincar um pouquinho de Deus, alterando coisas aqui e ali. Quer se sentir importante. Quer se sentir especial. E quem não quer?



Eu costumo dizer que, pra ser psicólogo, você deve ter uma fé inabalável no ser humano. Você precisa admirar essa espécie acima de todas as outras (se eu admirasse mais as plantas, seria botânica, se fossem os cães, seria veterinária). Creio que é preciso, acima de tudo, QUERER BEM ao ser que está na sua frente, tendo ele feito o que tiver feito (guardadas, é claro, as devidas proporções e limites pessoais).

Eu acredito na evolução humana, e acredito que a mudança é não apenas possível – ela é na verdade a única coisa que podemos contar na vida. A única certeza que a gente tem é que tudo vai mudar, e melhor ainda se a gente mudar junto! E às vezes, tudo o que precisamos é de uma leve orientação, alguma dica concreta, alguma observação que nunca fizemos antes.

Daí, segue-se a resposta para a outra frequentíssima pergunta: por que raios eu escolhi a cognitivo-comportamental, se o grande barato da psico é justamente a Psicanálise??

Aí, SUPRESA: pra ser psicanalista você nem precisa ser psicólogo! Porque Psicanálise e Psicologia não são exatamente a mesma coisa. Aliás, NÃO SÃO. A Psicanálise é um MÉTODO, assim como existem vários outros. E é claro que a grande maioria confunde uma coisa com a outra por conta da falta de informação. Por exemplo, você já ouviu falar em Gestalt-terapia? Em Fenomenologia? Em Behaviorismo? Aposto que não.

Eu também não tinha ouvido falar quando entrei na faculdade, e entrei (como todo mundo) super afim de ler Freud. E li, até o último ano da faculdade, milhares de textos psicanalíticos que eu amava. E, momento “confesso”: EU ODIAVA TCC. Mas odiava tanto que cabulei muitas e muitas aulas (o que me levava a entender muito pouco e detestar mais ainda, dando início a um ciclo sem fim que culminou em notas medíocres e pouquíssimo conhecimento).



Hoje concluo que tive uma má professora. Pois alguns anos depois de me formar, quiseram os Deuses da Vida Profissional que eu me interessasse justamente pela área de Saúde Mental (leia-se Doença Mental), onde a Psicanálise veio perdendo terreno nas últimas décadas. E aí, tive que estudar TCC na marra, por conta própria, do zero.

Foi uma descoberta incrível, guiada por excelentes “professores” e colegas. Nessas horas você entende o quanto o aprendizado pode ser auto-motivador quando os resultados não são apenas expressos em números na folha de prova. Eu PRECISAVA fazer aquilo bem, pra ajudar os pacientes. Era uma RESPONSABILIDADE.

E os resultados apareciam! E tudo fazia sentido, os pacientes iam melhorando, eu ia estudando, cada vez mais motivada e cada vez mais percebendo que, quando você faz algo que acredita, você faz MUITO MAIS BEM FEITO. E que quando você sai da teoria, você desmistifica muita coisa errada que vinha pensando a respeito.

Então, voltando à pergunta: por que a Terapia Cognitivo-Comportamental?

Porque ela funciona. Por que eu ACREDITO nela. Porque eu VEJO ela funcionar na minha frente, e rápido! E vejo as pessoas mais felizes por conta de pequenas modificações nas variáveis que estruturam suas vidas (as chamadas “contingências”). Percebi, na prática, que às vezes apenas SABER o que está acontecendo não basta, como eu pensava em minhas épocas de Psicanálise. Trazer a questão à consciência raramente resolve o problema – você precisa mudar o seu comportamento!

Talvez este seja o fator que mais me encanta em ser da TCC: perceber o sentido PRÁTICO de todo o raciocínio que embasa essa abordagem. Ver acontecer ali não apenas a mudança de dentro pra fora (como a gente adora falar), mas as DE FORA PRA DENTRO TAMBÉM! Perceber o valor de um novo comportamento instalado, mesmo que, a princípio, ele não tenha sido dos mais espontâneos, trouxe um novo sentido na minha própria existência – percebi que, para sermos aquilo que sonhamos ser, precisamos de uma única coisa: UM COMPORTAMENTO ORIENTADO PARA AQUILO.

E a TCC representa, hoje, o método, o “comportamento orientado”, que me permite atingir a minha satisfação profissional. A TCC me reforça! E como um campo em desenvolvimento que só recém está recebendo mais atenção, tem sempre alguma coisa nova rolando que me estimula a estudar e a ser uma profissional cada vez melhor pros meus pacientes.

Eu acho que o estudo nunca acaba. Nunca chega essa hora em que você já sabe tudo. O conhecimento muda você, e você produz novo conhecimento. É um ciclo sem fim, e essa constante inovação da TCC me faz ser realizadíssima profissionalmente, por que o céu vira o limite. E pra ser psicólogo você realmente precisa acreditar no inesgotável potencial humano, levando em consideração todas as suas facetas: a psicológica, a biológica (tão negligenciada pelas abordagens psicodinâmicas!) e, por que não?, até a espiritual.



O ser humano é um ser tão rico e pleno, tão cheio de possibilidades, que eu não poderia nunca passar minha vida explorando apenas uma parte desse TODO que é a vida da gente. E talvez por isso que eu goste também tanto da escrita – assim como em Psicologia, as possibilidades criativas são infinitas. Cada paciente que encontro me proporciona um experienciar único, uma vivência única, um universo completamente singular. É um “livro” acontecendo bem ali na minha frente.

E é pela possibilidade de usar a felicidade alheia como combustível da minha própria, iniciando um círculo vicioso hiper benéfico, que hoje eu não escolheria ser ou fazer nada além do que eu já faço, estando no exato instante, e no exato local onde me encontro.




domingo, 1 de setembro de 2013

TRISTEZA vs DEPRESSÃO: A DIFERENÇA ENTRE O NORMAL E O PATOLÓGICO



Em tempos em que os termos médicos e científicos tornam-se conhecidos pela comunidade, observamos um efeito colateral inevitável: a banalização e generalização dos diagnósticos psiquiátricos. Se por um lado, é fantástico que mais pessoas saibam que existe uma doença chamada Depressão, por outro corremos o risco de, de repente, toda tristeza da vida passar a se chamar “Depressão”. E se TODA tristeza é Depressão, nenhuma acaba sendo levada a sério. Principalmente as “verdadeiras”.

Então, agora que os amigos de João ouviram falar em Depressão, João não está triste, João está deprimido. E segundo seu amigos, se João está deprimido, João precisa de remédios. Isso assusta João, ou então o envergonha, então João sequer cogita a possibilidade de ir ao médico. Bem, talvez João precise de remédios, talvez não. Talvez João esteja genuinamente triste por ter se divorciado no mês passado, como qualquer pessoa do planeta ficaria. Sua vizinha Maria também está triste – seu cachorinho morreu atropelado. Há 3 anos. E Maria continua triste. Maria não consegue superar esta perda.

A tristeza de Maria é normal, ou patológica? E a tristeza de João? Como você pode saber se sua tristeza (ou a do vizinho) é passageira, ou se veio pra ficar e requer cuidados médicos?

A resposta mais óbvia é que você deveria procurar um médico. Afinal, o diagnóstico de uma doença cabe aos médicos. Mas muitas vezes o dilema se forma antes disso: quando é a hora de procurar um médico?

A tristeza é um sentimento comum, presente na vida de qualquer ser humano. Ela é uma emoção perfeitamente adequada a situações em que existam perdas, conflitos, decisões, mudanças, frustrações. Ficar triste é normal, mas, via de regra, a vida trata de trazer outros eventos significativos, outros prazeres e felicidades, e comumente uma dor é superada e a vida continua. Mas e permanecer triste? Seria essa a fronteira entre normal e patológico? Uma tristeza que não passa?

Quando falamos em Transtorno Depressivo, estamos falando de uma Síndrome: um conjunto de sinais e sintomas. Não basta estar triste para estar deprimido – precisa ter uma série de sintomas, característicos da Depressão. Variáveis como duração, intensidade, alteração nos níveis de vitalidade, funções fisiológicas e cognitivas, e prejuízo no funcionamento global do indivíduo são os parâmetros atuais para se diferenciar a tristeza normal da Depressão. Quer dizer: há quanto tempo você se sente triste? E quão triste você se sente (você tem ideias de suicídio, por exemplo?)? Você não está triste, mas tem se sentido cansado, sem disposição para as tarefas cotidianas? Não sente mais prazer em nada? Sua memória anda prejudicada? É difícil prestar atenção nas coisas? Você se afastou da família ou amigos? Não dorme? Ou dorme demais?

Essas perguntas, bem como muitas outras, ajudam a delinear e a fechar um diagnóstico mais ou menos preciso. Grosso modo, pode-se sintetizar: se sua tristeza é desproporcional à situação que a deflagrou, dura tempo demais, e altera seu comportamento significativamente, você pode estar deprimido.

Voltemos a João: ele está triste porque se divorciou. Mas consegue trabalhar normalmente, e gradativamente, conforme os dias passam, ele consegue ter momentos felizes. Claro, demora algum tempo para ele estar de volta aos happy-hours da empresa em que trabalha, às vezes fica desanimado, mas no geral, João “funciona bem”. Logo, João não parece atender aos critérios para Depressão. Sua tristeza “passou”. Mas sua vizinha Maria, desde que o cachorro morreu, 3 anos atrás, sente-se triste a maior parte do tempo, quase todos os dias. Não tem vontade de fazer nada: fica em casa o tempo todo, tem dificuldade para dormir, não quer ver os amigos, não se arruma mais. Na verdade Maria se sente tão mal, mas tão mal, que abandonou seu emprego e perdeu quase 10kg, porque não sente mais vontade nenhuma de comer.

Maria tem um quadro diferente do de João. Ela teve uma alteração nítida de comportamento, e várias de suas funções fisiológicas se alteraram (o sono, o apetite, a disposição física). A duração de seu luto pelo cachorrinho é longa demais, desproporcional ao evento. Esses são os sinais indicativos mais nítidos de que Maria tem um Transtorno Depressivo.

Diagnosticar uma Depressão não é uma tarefa simples – exige uma investigação detalhada e minuciosa do quadro atual do indivíduo. Mas mesmo antes de chegar ao médico, muitas pessoas não se atentam para o que realmente significa uma Depressão, ou ao contrário, subestimam seus sintomas e passam muitos anos em sofrimento e sem buscar ajuda médica, especialmente devido ao preconceito e ao estigma social que a Depressão carrega.

Isso se torna especialmente perigoso no caso da Depressão, pois é a doença que mais incapacita pessoas no mundo, estando à frente das doenças cardíacas, neurológicas e oncológicas. Estima-se que 18% da população mundial sofra de Depressão, o que significa, atualmente, mais de 1 BILHÃO de pessoas!

Portanto, se você suspeita que você (ou seu conhecido) possa estar deprimido, atente-se para estas variáveis:

·         Humor deprimido: sentir-se deprimido a maior parte do tempo, por um período de tempo prolongado;
·         Interesse diminuído ou perda de prazer para realizar as atividades de rotina;
·         Sensação de inutilidade ou culpa excessiva;
·         Dificuldade de concentração ou de memória;
·         Cansaço excessivo e perda de energia;
·         Alteração de sono: insônia ou hipersonia (dormir demais)praticamente diárias;
·         Problemas psicomotores: agitação ou lentificação (observado por outros);
·         Perda ou ganho significativo de peso, sem estar de dieta alimentar;
·         Ideias recorrentes de morte ou suicídio. 

Se estas variáveis estiverem presentes, e alteradas, de maneira significativa, não hesite em procurar um médico ou em estimular seu conhecido para que ele o faça. Um médico competente será capaz de realizar o diagnóstico e fazer a prescrição terapêutica.

Atualmente, os melhores resultados em tratamentos para Transtornos Depressivos são encontrados a partir da combinação de medicamentos e psicoterapia (em especial a Terapia Cognitivo-Comportamental), e estes serviços estão disponíveis inclusive na rede pública de saúde. Você pode ir ao posto de saúde mais próximo de você, por exemplo.

O mais importante é não deixar uma suspeita passar em branco – se você acha que pode estar deprimido, verifique! Melhor voltar do médico com as mãos abanando e nenhum diagnóstico, do que levar anos e anos de sofrimento até recebê-lo =)




terça-feira, 23 de julho de 2013

5 HÁBITOS BENÉFICOS PARA QUEM SOFRE DE ANSIEDADE


  1.  Pratique exercícios

Que fazer exercício é bom pra saúde do corpo, isso ninguém duvida. Já sabemos também faz tempo que a fabricação de endorfinas acontece durante as atividades físicas, e que estas são responsáveis por bem-estar e sensação de prazer. Ok, e a mente, onde entra?

A distinção mente-corpo é puramente didática. Sabemos que os circuitos cerebrais comandam boa parte de nossa regulação emocional, e em se tratando da ansiedade, que como já descrito aqui é parte de um processo psicofisiológico, essa distinção é mais teórica do que nunca.



Corpo são, mente sã. A importância das atividades físicas para o equilíbrio emocional vai muito além do ditado popular: a prática de exercícios proporciona o gasto de uma energia corporal que, quando não dissipada, pode trazer tensão e agitação mental. O exercício físico, especialmente o aeróbico, funciona como uma espécie de descarga ou válvula de escape, tendo sido comprovado por vários estudos como eficiente na redução dos sintomas de ansiedade.

Esse efeito parece ser especialmente eficaz em casos de Transtorno de Pânico, uma vez que a alta sensibilidade e a percepção errônea do indivíduo quanto aos próprios sinais corporais é a principal responsável por deflagrar a crise; assim, o fato destes sinais corporais serem semelhantes aos que são observados durante a prática de exercícios (aumento de pressão arterial, taquicardia, contração muscular etc), e do indivíduo ir se acostumando a senti-los em contexto diferente ao contexto ansioso já efetua a dessensibilização, ou aumento da tolerância e ajuste da percepção sobre estes mesmos sinais.

Entretanto, devido ao mesmo motivo, quem sofre de ansiedade pode ter, justamente, mais resistência a praticar exercícios – por associarem as sensações aversivas aos sinais corporais, a princípio a atividade física pode parecer bastante difícil de ser mantida. Ainda assim, é de consenso na comunidade científica de que os efeitos da prática de atividades físicas são extremamente benéficos a curto, médio e longo prazo.

2.       Durma bem


O período de sono é uma das necessidades mais básicas do ser humano, e não é à toa. Enquanto dormimos, nossas atividades cerebrais se rebaixam a um nível mínimo, e é durante este período que boa parte de nossas memórias são processadas, o que está diretamente ligado à aprendizagem e aquisição de conteúdos novos.

Enquanto dormimos, o cérebro se reestabelece. Os músculos descansam, as estruturas se reorganizam. Esse grande computador que trabalha 24 horas por dia durante mais de 70 anos (em média) também precisa ser “desligado” e “recarregado” durante algum tempo, tal como fazemos com nossos PCs. Os arquivos mentais precisam ser organizados, as memórias do dia e os novos conteúdos precisam ser integrados ao “arquivo central”. E tal como um computador, o que acontece se não o desligamos durante muito tempo, ou não recarregamos?

A máquina “trava”. A bateria acaba. Os programas não rodam direito. Da mesma forma, nosso cérebro começa a travar, e vários estudos já apontam que esse mau-funcionamento conduz à ansiedade e depressão.



De fato, alguns destes estudos reafirmam que a necessidade média é de 8 horas de sono por noite – o tempo mínimo que o cérebro humano médio precisa para se recuperar. Com menos do que isso, as informações não se processam direito, os circuitos cerebrais não têm tempo de se organizar, e o funcionamento mental fica comprometido, aumentando a chance de problemas de concentração, memória e aprendizagem. Os níveis de atenção caem e o desempenho motor também fica prejudicado.

Como um dos sintomas de ansiedade é, comumente, a própria insônia, são justamente as pessoas que mais têm dificuldade de dormir as que mais precisam regular seu sono. Assim, recomenda-se que comecemos a nos preparar para dormir algumas horas antes do horário planejado: diminuindo o ritmo de nossas atividades, ingerindo alimentos leves e praticando as recomendações do que é hoje chamada Higiene do Sono: hábitos saudáveis do bem-dormir.

3.       Evite estimulantes


Sabemos que a ansiedade é um estado físico e emocional marcado pela hiperexcitação, agitação e elevação da maior parte dos sinais corporais (respiração, batimentos cardíacos, pressão arterial etc). O ansioso é um indivíduo que permanece, na maior parte do tempo, num estado de excitação mental e física desagradáveis.

As substâncias que consumimos agem sobre nosso organismo e os modifica, bem como são por ele modificados. Algumas, mais especificamente, exercem um poder estimulante sobre o cérebro, alterando “quantitativamente” a qualidade do nosso funcionamento global. Sobre o organismo de um ansioso, isso equivale a “colocar lenha na fogueira”, sendo a fogueira aquela que está justamente tentando ser controlada.



No rol dessas substâncias está o café, os chás que levam mate (ricos em cafeína), os cigarros, os refrigerantes à base de cola, as pimentas e especiarias, o gengibre e – PASME – o chocolate, que contem cafeína. Além disso, as bebidas estimulantes (“Red Bull”, “Flash Power” etc) contém também cafeína e guaraná, e exercem efeito estimulante no organismo até várias horas depois de seu consumo.

Sendo assim, a pessoa que sofre de ansiedade – e que, portanto, já está com o organismo excitado – deve evitar estas substâncias, e investir naquelas que promovem o relaxamento e o bem-estar, como a camomila, os alimentos ricos em vitamina C e em complexo B, além dos peixes e as folhas do maracujá (sim, é nas folhas que está todo o seu poder calmante).

4.       Respire direito


Neste texto aqui eu indiquei algumas técnicas respiratórias bastante simples para os ansiosos de plantão. De fato, a respiração é a aliada número 1 de quem sofre de ansiedade, pois possui uma influência enorme nos ritmos fisiológicos e interfere diretamente no ritmo cardíaco.

Quando estamos ansiosos, nossa respiração reflete isso: respiramos “curtinho”, a famosa respiração “cachorrinho”. Respirar assim causa hiper-ventilação, o que agrava ainda mais os sintomas de ansiedade. Logo, a solução é fazer o contrário: respirar devagar e profundamente, de preferência pela parte baixa do ventre (respiração diafragmática), dando ênfase a expirar pela boca, bem devagar (é de fato a expiração que promove o relaxamento).

No nosso cotidiano, respiramos no “automático”, e muitas vezes não percebemos o quanto estamos provocando uma reação negativa em nosso organismo. Estar atento à respiração é uma das premissas básicas de quem deseja manter a ansiedade sobre controle, e treinos diários de respiração profunda e prolongada fazem parte de TODOS os protocolos de tratamento a Transtornos Ansiosos.



Apesar disso, quem não sofre de ansiedade patológica também pode (e deve!) investir em uma respiração mais saudável e concentrada, de forma a garantir maior qualidade de vida: a respiração adequada é defendida há muitos e muitos anos pelos praticantes de yoga que, por sinal, tem sido comprovada como eficaz no tratamento à ansiedade e depressão.

Praticar a respiração diafragmática todos os dias, 3 vezes por dia, com 15 repetições a cada vez, é um ótimo começo. Você pode fazer em qualquer lugar: no banho, no trânsito, no escritório. A concentração na respiração promove também uma “trégua” à mente, uma vez que com ela ocupada por estar concentrada na respiração, o fluxo mental e a cadeia de pensamentos diminui.

5.       Exercite o silêncio


Por falar em trégua na mente... quando foi a última vez que você ficou em silêncio, sem fazer nada, apenas percebendo seus pensamentos e sensações?

Quem é ansioso sabe bem que tem momentos em que o fluxo mental se acelera, se avoluma, e os pensamentos ficam como um turbilhão. A excitação mental supracitada é verificada também no funcionamento cognitivo, quando um volume cada vez maior de pensamentos (normalmente negativos) invade a mente. Preocupações, organizações mentais, previsões negativas – todos estes conteúdos típicos de uma mente ansiosa ficam ali rodando e causando ainda mais aflição e ansiedade. E nós vamos rodando junto, totalmente absorvidos por este fluxo incessante de ideias.



Parar e observar estes pensamentos, sem tentar exercer nenhuma influência sobre eles, é uma forma de combater a ansiedade. Como se nos distanciássemos da questão e observássemos, como numa tela de cinema, tudo o que pensamos como se não fosse nosso. Uma forma de meditação em que tudo o que precisamos fazer é NADA. Apenas observar.

Silenciar e se observar tem sido uma forma comprovadamente eficaz de tratar a ansiedade de maneira geral, e recentes modalidades psicoterápicas têm se debruçado sobre estas novas formas de controle mental. Treinos em Mindfullness se dedicam justamente a isso: acolher e gerenciar os pensamentos que nos inundam sem desespero, sem preocupação e sem nos identificarmos com eles.

Você pode experimentar fazer isso todos os dias, por pelo menos 5 minutos. Apenas feche os olhos e perceba o que está passando pela sua cabeça. Não julgue, não rejeite, não entre no assunto: apenas observe os pensamentos surgirem e desaparecerem como pequenas ondas no oceano – uma vem, depois se vai, outra se forma e ocupa seu lugar.


Apenas observe. Com o tempo você desejará fazer isso mais vezes, como em um intervalo entre reuniões estressantes por exemplo. Você pode aumentar o tempo, ou aliar a esta prática seu treino diário de respiração, desfrutando totalmente desse momento de “pausa interna”.

sexta-feira, 10 de maio de 2013

O que esperar da terapia?





Ouço, com frequência, alguém dizer que pensa em fazer terapia cognitivo-comportamental, mas que “não sabe”. Também com alguma freqüência, pessoas que me procuram interessadas em iniciar um processo psicoterapêutico em TCC se dizem preocupadas quanto ao que esperar. Às vezes pessoas me pedem indicações de psicoterapeutas e, quando eu pergunto se de fato foram consultá-lo(a), elas revelam que desistiram - em algum momento entre pegarem o telefone do psicólogo e chegarem ao telefone para contatá-lo.

Essas intercorrências por vezes me fazem pensar sobre o que acontece com os potenciais pacientes que, muitas vezes, jamais chegam a se consultar com um terapeuta cognitivo-comportamental, a despeito de terem tido iniciativas nesse sentido. Onde eles foram parar? O que os levou a desistir?

Eu costumo brincar dizendo que na porta de todo consultório de psicologia existe um “buraco de espera”. Neste buraco, os pacientes podem acabar caindo e permanecendo por meses, às vezes anos, sem jamais tocar a campainha. Às vezes trata-se apenas de um período de “fermentação” da idéia de iniciar psicoterapia. Mas às vezes, este “buraco” se torna um muro, uma parede intransponível, que alguns jamais atravessam.

Recentemente, me dediquei a descobrir o que acontece neste “buraco”, e me deparei com aquilo que, via de regra, permeia nosso cotidiano integralmente: as crenças. Quando recebo um paciente, gosto de perguntar a ele: o que você espera da TCC? O que se revela, com esta simples pergunta, é que os pacientes têm suas próprias crenças sobre o que poderão esperar de uma terapia – o que irá acontecer, como serão as sessões, o que precisarão fazer. E, infelizmente, ocorre que na grande maioria das vezes estas crenças são bastante irreais, ou ao menos pouco razoáveis.

A Psicologia, e em especial a TCC, é uma área complicada, e já passou por inúmeros momentos sociais e políticos. Mas sem exceção, todos os momentos foram marcados por bastante estigma: terapia é para loucos! Terapia é para quem está mal. Pessoas fracas fazem terapia. A terapia muda quem você é. Eu vou ter que contar meus segredos. O terapeuta vai me julgar.

 E em relação à TCC, especificamente: o terapeuta vai mandar em mim. Vou ser domesticado. O terapeuta é alguém frio. A terapia será distante, desprovida de afeto. O terapeuta não tem problemas (essa é ótima). Eu vou falar o que está acontecendo e ele vai me dar a solução. Vou ter que fazer mil lições de casa.
Algumas pessoas ficam desconfortáveis com estas ideias e desistem de procurar uma TCC.  Outras chegam à terapia com expectativas altíssimas e se frustram. Então elas vão embora. As perdemos “para sempre”. Por isso, considero algo imprescindível a INFORMAÇÃO. Romper os paradigmas e as crenças irreais sobre o processo de psicoterapia em TCC é a primeira tarefa que me proponho ao iniciar um processo de psicoterapia com um paciente, e é algo que faço através de materiais simples como folhetos explicativos e muita discussão a respeito.

Conseguir proporcionar um ambiente seguro, em que as expectativas do paciente possam ser moduladas, é um grande preditor de sucesso da terapia, e aqui neste post procurei reunir algumas informações básicas que se propõem a responder a grande pergunta: o que posso esperar da terapia cognitivo-comportamental?



AMBIENTE  SEGURO

Quem procura uma terapia normalmente já se encontra em um processo de tentativa de mudança e, na maioria das vezes, já tentou sozinho modificar coisas importantes. Já leu livros, conversou com amigos, procurou a família, testou possibilidades – sem sucesso ou com resultados aquém do que esperava. Então, vias de regra, o paciente chega ao consultório em um certo “ponto de urgência”, em que se dispõe a pedir ajuda de um “estranho” para modificar sua vida.

Como em QUALQUER abordagem clínica de psicoterapia, é crucial que essa pessoa, que normalmente está sofrendo, sinta-se acolhida e segura. Ela não quer encontrar mais julgamentos – o que ocorre facilmente nas relações permeadas por afeto e por expectativas como amigos e parentes. Muitos pacientes têm medo do que o terapeuta irá pensar, mas essa é uma preocupação desnecessária, apesar de bastante natural.  A terapia deve proporcionar um ambiente de confidencialidade e conforto, um local em que possa se despir de quaisquer máscaras que sinta necessidade de utilizar em seu cotidiano, e o terapeuta responsável deverá adotar uma postura de neutralidade, empatia e aceitação, e de absoluto comprometimento com o processo de mudança.

O terapeuta responsável, seja ele cognitivo-comportamental ou não, cuidará para que o paciente sinta-se bem-vindo, e fará de seu processo uma prioridade durante aquele período semanal em que se encontram. As questões de sigilo e segurança são premissas básicas de todas as abordagens clínicas, que devem permear o processo desde o primeiro encontro, e também devem ser alvo de discussão caso isso se faça necessário. Pacientes com problemas de confiança devem poder relatar seus sentimentos a respeito, e serem incondicionalmente apoiados – ali é o espaço correto para poder falar a respeito.

SOLUÇÕES MÁGICAS x ESFORÇO

Qualquer terapia é um processo a dois. Em TCC, essa condição é elevada ao cubo. Paciente e terapeuta formam uma equipe, cujo principal objetivo é o alcance das metas estipuladas. Para tanto, cada um deverá assumir suas próprias responsabilidades, o que envolve esforço e dedicação. Por vezes, o paciente imagina que, ao colocar seu problema em discussão, o terapeuta terá uma resposta rápida, mágica, brilhante, um exercício de casa ou algo que “ele nunca havia pensado antes”. Essa é uma das crenças mais irreais que existem, mas que é muito fomentada pelos livros e filmes que abordam a temática da terapia.

Na grande maioria das vezes, a “solução” apresentada é velha conhecida do paciente, e muito provavelmente já foi inclusive tentada. O que muda é que o paciente não está mais sozinho em sua jornada: o terapeuta atuará como um técnico, que intervirá tanto para motivá-lo, quanto para ajudá-lo a atravessar os obstáculos naturais do caminho. Em TCC, essa colaboração é um dos aspectos mais fundamentais, um verdadeiro alicerce do processo. A ideia principal é a de que, juntos, podem otimizar o processo de mudança, mas que não é possível retirar o esforço da equação – nem do paciente, nem do terapeuta. Mudar exige empenho, dedicação, persistência e uma grande dose de confiança.

COMPROMETIMENTO

Enquanto equipe, terapeuta e paciente têm um compromisso um para com o outro. Isso significa que, juntos, deverão fazer da terapia uma grande prioridade, algo a ser levado realmente a sério, especialmente em termos de assiduidade, pontualidade e execução de tarefas e exercícios. Muitas pessoas acham esse aspecto algo difícil de lidar a princípio, pois requer que haja um verdadeiro enquadre daquela situação dentro da vida do paciente. A terapia deverá encontrar um espaço dentro de seu dia-a-dia, um espaço constante em sua mente, uma dedicação genuína.

É claro que, como em qualquer compromisso que se assuma, faltas e atrasos são esperados, mas compreender o nível de responsabilidade envolvido num processo de mudança é uma parte fundamental do processo, pois significa, em última análise, comprometer-se consigo mesmo. Da mesma maneira que alguém evitará faltar a uma hemodiálise, por exemplo, ou a um encontro importante por reconhecer a importância que tal evento terá para sua vida e seu bem estar, a terapia deverá ser encarada e priorizada da mesma forma.

Isso também é válido no que se refere às tarefas de casa – uma parte importante e de destaque na TCC. Eu costumo dizer que TCC é 50 minutos no consultório e outros 6 dias, 23 horas e 10 minutos fora dele. Comprometer-se com as tarefas, realizá-las, e manter a terapia “em ação” em seu cotidiano é fundamental para se obter bons resultados. Novamente, é um compromisso consigo mesmo.

TROCA

Muitas pessoas, ao procurarem terapia, se dizem um pouco desmotivadas com a ideia de “falarem o tempo todo”. Elas se perguntam o que tanto irão falar, e no que falar poderá de fato ajudá-las. Muitas sentem-se sozinhas num cenário assim. Especificamente no que se refere à TCC, alguns pacientes sentem-se surpresos quanto à pró-atividade do terapeuta e o diálogo intenso que ocorre em sessão. A bem da verdade, muitos procuram a TCC justamente por já terem se fartado de “apenas falar”.

Talvez devido às características próprias da TCC, é verdade que o terapeuta desta abordagem costuma ser mais dinâmico e participativo. Ele realmente assume a sua parte da responsabilidade, que seja: desafiar e questionar os pensamentos e crenças do paciente com bastante frequência. As intervenções comportamentais são, muitas vezes, sugeridas pelo terapeuta, que através da análise cuidadosa das contingências atuais descritas pelo paciente, observa possibilidades ricas de mudança.

O diálogo em TCC costuma ser intenso, o que poderá causar estranheza a pacientes que venham de outras abordagens clínicas. Com o tempo, entretanto, percebem que o espaço da fala é assim melhor distribuído, e que a fala do terapeuta tem caráter objetivo, já que o propósito da TCC não é apenas catártico (“desabafar”) – e sim de ação e mudança.



EMPATIA, AFETO E ELABORAÇÃO EMOCIONAL

Uma das maiores crenças a respeito da TCC talvez seja a de que o terapeuta é um indivíduo frio e racional, e que não há espaço para emoções na relação terapêutica e no trabalho em TCC. Nada poderia ser mais equivocado – as emoções são uma parte indispensável do processo, uma importantíssima porta de entrada para o mundo da cognição.

Em parte, essa ideia sobre a extrema racionalidade da TCC se deve a que, de fato, são as cognições do paciente o enfoque central de todo o tratamento, inclusive para que resultados possam aparecer mais rapidamente – isso requer mais objetividade e foco. Mas isso não significa, em absoluto, desqualificar ou não dar a atenção devida às emoções, até porque se não fossem as emoções, indivíduo nenhum procuraria fazer terapia.

O paciente que chega ao consultório está normalmente, sofrendo. Esse sofrimento precisa ser acolhido, mas são suas bases cognitivas que serão esmiuçadas. Isso devido às bases teóricas da TCC, que consideram a interpretação dos eventos (e não apenas o que se sente sobre eles) a verdadeira causa das emoções ditas “negativas”, e a chave do processo de mudança. Poderá parecer que a emoção não é o “ponto alto” do processo, mas essa percepção se revelará brevemente infundada quando o paciente entender que seu processo de mudança requererá a compreensão emocional.

Portanto, é claro que a emoção precisará ser trazida à tona no processo terapêutico. Não há mudança verdadeira que não passe por uma mudança emocional. Isso também é verdadeiro no que tange a relação terapêutica, pois são dois seres humanos complexos que estão interagindo e buscando soluções para um sofrimento. Todo processo psicoterápico requer uma relação de confiança e de empatia, ou seja: um vínculo de afeto. O terapeuta cognitivo-comportamental é obviamente empático e acolhedor, porém é, definitivamente, mais objetivo.

PARA RESUMIR...

O que se pode esperar da terapia e, mais especificamente, da TCC?

Um local seguro e acolhedor, onde se desenvolverá uma relação de confiança, afeto e empatia. Um local para ser autêntico e genuíno, pois afinal, para atingir qualquer objetivo, é necessário conhecer bem o ponto de partida. Para tanto, deverá haver objetividade, foco e comprometimento – a “equipe” formada entre terapeuta e paciente trabalhará com afinco, com esforço, em direção às metas estipuladas. Acima de tudo, pode-se esperar que a terapia seja um momento de encontro consigo mesmo, de auto-estudo e de compreensão do próprio funcionamento, de suas emoções e cognições. Pois nos dizeres de Epicteto, grande filósofo e influência significativa da Terapia Cognitiva: “é impossível para um homem aprender aquilo que ele acha que já sabe.


sexta-feira, 26 de abril de 2013

TÉCNICAS DE CONTROLE DE ANSIEDADE


Como já descrevi em um outro post, a ansiedade é um estado fisiológico, selecionado naturalmente na espécie humana, cuja função é de, basicamente, preparar o organismo para enfrentar um perigo.

A ansiedade patológica ocorre quando este estado está desproporcional à situação enfrentada, ou quando ocorre na ausência de qualquer perigo real. Uma vez que a percepção de perigo depende fundamentalmente do processamento cognitivo do indivíduo, podemos dizer que mesmo uma situação de perigo imaginário (fantasias) é capaz de desencadear respostas de ansiedade em uma pessoa.

Sendo um ou outro caso a situação, em todas elas a ansiedade possui uma manifestação física importante, e os seguintes sintomas estão normalmente presentes:

·         Taquicardia
·         Respiração difícil, curta ou faltando
·         Tremor nas mãos ou em outras partes do corpo
·         Sudorese excessiva
·         Desconforto abdominal
·         Sensação de medo ou perda de controle


O que fazer em relação a estes sintomas?

À parte a recomendação consensualmente aceita de medicação e psicoterapia, existem algumas técnicas bastante simples que podem ser utilizadas a qualquer momento, e que interrompem, relativamente rápido, o estado corporal que a ansiedade provoca. Elas podem ser utilizadas tanto no tratamento dos Transtornos Ansiosos como também em caráter preventivo – aos primeiros sinais de ansiedade ou de desconforto emocional.

 1.       TÉCNICAS DE RESPIRAÇÃO


 RESPIRAÇÃO DIAFRAGMÁTICA


A respiração tem um papel importantíssimo no processo fisiológico da ansiedade, uma vez que a hiperventilação (respiração rápida, curta e superficial, estilo “cachorrinho”) tem o poder de intensificar os sintomas ansiosos. Sendo assim, a solução é fazer  inverso: respirar profundamente, devagar e, de preferência, pelo diafragma.

Experimente enviar o ar inspirado para a região baixa do abdômen, abaixo das costelas. Para auxiliar, você pode imaginar que possui um pequeno balão nesta região, e intencionalmente enviar o ar para preenchê-lo. Colocas a mão sobre a região ajuda também, pois torna possível visualizar o movimento abdominal e assim apontar a respiração correta. Inspire pelo nariz e expire pela boca. Faça séries de 10 respirações, sempre contando e dizendo o número em voz alta, e então iniciando o ciclo respiratório em tempos iguais (por exemplo, 3 segundos para inspirar e outros 3 para expirar).



NOTA: essa respiração utiliza o músculo diafragmático, e portanto é possível sentir algum cansaço durante o exercício. Não se preocupe, pois esse cansaço ou desconforto desaparecerá com a prática. Inicie com 5 minutos (ou 10 repetições) pela manhã e verifique um início de dia mais tranquilo e descansado. Se desejar, utilize qualquer momento favorável do dia para praticar – no trânsito, banho, reunião com o chefe ou em qualquer momento em que sinta-se ansioso.

RECAPTAÇÃO DE CO²

O equilíbrio respiratório depende de um cálculo entre a quantidade de oxigênio inspirado, a quantidade de CO² expirado e o quanto destes gases permanecem dentro do organismo entre uma respiração e outra. Na hiperventilação (respiração cachorrinho), este equilíbrio é prejudicado devido aos altos índices de oxigênio (inspiração ) e baixos índices de gás carbônico (CO²) eliminados na expiração.

Este desequilíbrio produz mal-estar, dor abdominal e sensação de vertigem, o que agrava os sintomas de ansiedade, e reestabelecer este equilíbrio é relativamente simples – a velha técnica de “respirar no saquinho” que tanto vemos nos filmes da TV. De fato funciona: basta expirar pela boca dentro de um saquinho de papel, devagar e pausadamente, e inspirar o ar do próprio saquinho. Faça diversas vezes seguidas, sem tirar a boca de dentro do saquinho.



DICA: na falta de um saquinho (ninguém tem este hábito de andar por aí com um saquinho dentro da bolsa, não é?), coloque uma palma da mão sobre a outra em forma de concha e respire ali dentro. O efeito é exatamente o mesmo.

2. TÉCNICAS DE RELAXAMENTO 

Existem diversos tipos de técnicas de relaxamento, todas com o objetivo de obter, basicamente, um estado fisiológico agradável e de tensões reduzidas. Embora grande parte deles trabalhem tendo em vista uma sensação de tranquilidade e bem-estar, existem pequenas diferenças técnicas que focam em um ou outro aspectos mais específicos.

O Relaxamento Muscular Progressivo  de Jacobson é uma técnica que foca em, principalmente, um aumento da percepção corporal e consequente aumento do controle muscular. Essa percepção corporal mais acurada é especialmente importante para os que sofrem de ansiedade pois permite que  indivíduo perceba os primeiros sinais de tensão e ansiedade, podendo agir muito mais rapidamente e de maneira bastante eficiente no combate à mesma.

Como o próprio nome diz, trata-se de uma técnica de relaxamento progressivo, ou seja, gradativo, por meio da tensão e relaxamento dos grupos musculares. Nos indivíduos ansiosos, é comum que haja muita contração dos músculos do corpo sem real percepção de que isso esteja ocorrendo. Portanto, é importante identificar quais são estes estados musculares (a tensão e o relaxamento) através da indução dos mesmos. Assim, o indivíduo vai, primeiramente, tensionando os músculos, para em seguida, relaxá-los.

Você pode experimentar fazer isso “de baixo para cima”, ou seja, dos pés até o topo da cabeça. Deitado ou sentado, de olhos fechados, vá visualizando cada parte de seu corpo separadamente, e foque sua atenção a cada grupo de músculos individualmente. Por exemplo, a focar sua panturrilha, procure sentir a tensão na mesma – com a perna estendida, contraia a musculatura puxando a ponta do pé para cima e esticando a linha do calcanhar. Permaneça 5 segundos nesta posição, sentindo a tensão do músculo e atentando  a cada parte do corpo envolvida. Perceba como este músculo se relaciona com as coxas, com os joelhos, com os dedos dos pés. Em seguida, solte abruptamente a musculatura e perceba a sensação de relaxamento.



Repita o processo com cada grupo muscular, de ambos os lados, sempre tensionando primeiro e depois soltando abruptamente.  Ao passar de um grupo muscular para outro, certifique-se de que o grupo muscular trabalhado está inteiramente relaxado. Pratique uma respiração calma e profunda durante todo o processo.

Este exercício pode ser feito à sua maneira – ouvindo música, ao ar livre, quando você está tenso ou mesmo quando não há nenhuma ansiedade ou estresse presente. Praticar o relaxamento e aumentar a consciência corporal não apenas é uma técnica útil para enfrentar a ansiedade, como também uma maneira eficiente de ganhar qualidade de vida.

3.       TÉCNICAS COGNITIVAS
 

VISUALIZAÇÃO

Visualize, em sua mente, a situação que o preocupa. Talvez você esteja muito ansioso com uma reunião, uma entrevista de emprego, ou com contas a pagar. Provavelmente, uma cena “preocupante” já passou pela sua cabeça muito antes de você se propor a fazer um exercício de visualização. São as nossas “imagens mentais”, que podem nos causar extremo desconforto, ansiedade, e toda uma extensa gama de sentimentos negativos.

Quando uma imagem mental causa desconforto, nossa primeira tendência é a de interrompê-la. É o famoso “não quero nem imaginar”. Pois a técnica aqui trata-se de justamente IMAGINAR. Não interrompa a cena preocupante – vá até o final. Imagine os detalhes, as cores, os cheiros, as pessoas, os diálogos. Deixa a cena se desenrolar, como a um filme que você assiste. Se sentir-se muito ansioso, pratique a respiração diafragmática enquanto visualiza.

Perceba o que ocorre com a cena: ela chega a um ápice de angústia e então desaparece? Ela termina tragicamente? Diante do resultado, existem algumas opções a seguir:

DESCATASTROFIZAÇÃO

Se sua cena atinge um clímax de ansiedade e então desaparece, é de se supor que você está bloqueando o final da mesma. “Avance o filme” e pergunte-se: o que de pior pode acontecer?  Talvez o final catastrófico seja uma demissão, um rompimento, ou algo bastante ruim. Tente visualizar este resultado e avance o filme novamente: o que aconteceu? Se for preciso, avance anos no tempo. O que aconteceu? O que de pior poderá acontecer?

Normalmente, o que se descobre com este tipo de exercício é que o resultado final pode ser realmente ruim, mas dificilmente é tão ruim que não possamos aguentar. O que ocorre é que, ao interrompermos a imagem em seu pior momento, não temos oportunidade de verificar nossas reais condições de enfrentamento. Somos, geralmente, mais capazes de lidar com os problemas do que acreditamos ser.

Visualizar uma cena até o final nos permite explorar todas as nossas alternativas, e desmistifica o que normalmente concebemos como “o pior”. Uma demissão, por exemplo, pode ser muito desagradável e gerar inúmeros problemas, mas quando você se pergunta “o que de pior poderá acontecer se eu for demitido?”, descobre que poderá arrumar outro emprego, pedir ajuda a amigos, fazer um empréstimo, vender o carro, enfim, alternativas outras que não “passar fome”, por exemplo.

IMAGINAÇÃO DE RESULTADOS

Você pode também interferir “no filme” e alterar o roteiro por trás da sua cena. Pode planejar um diálogo, modificar seu comportamento, criar situações favoráveis e transformar a cena preocupante em uma cena de sucesso.

Se você fica muito ansioso com uma apresentação que irá fazer, ou uma entrevista de trabalho, ou qualquer outra situação em que se sente inseguro, feche os olhos PR alguns instantes e imagine a cena desde o começo. Como você está vestido? Que horas sairá de casa? Como é o caminho? Procure fazer a cena da maneira mais agradável possível, mesmo que sinta interferências de pensamentos negativos.

Imagine o momento “crítico” acontecendo da melhor maneira, seu desempenho da maneira que você gostaria que fosse, a reação positiva das pessoas ao seu redor. Crie com detalhes sua cena agradável: seu tom de voz, as palavras, o ambiente, as perguntas e as respostas. “Volte o filme” e refaça algo que não saiu como gostaria.

Vá até o final “do filme” e termine-o vitoriosamente: visualize seu retorno agradável à sua casa ou ponto de partida e veja sua feição de sucesso. Sinta a sensação de conquista e de satisfação: tudo deu certo e saiu exatamente como você queria!

As técnicas de visualização podem, a princípio, parecer bastante ingênuas e simplórias. Entretanto, são comprovadamente eficientes ao gerar sentimentos positivos (bem como negativos) e auto-confiança. O cérebro é um organismo bastante plástico, dinâmico, no qual a fantasia se equivale à realidade. Pense bem: se uma cena desagradável na sua cabeça é capaz de fazer seu coração acelerar, uma cena agradável também é capaz de tranquilizá-lo.

“E SE ISSO ACONTECER?”

Esta é uma técnica semelhante à descatastrofização, porém em “versão” escrita.

Numa folha de papel, escreva o que lhe aflige. Tente ser sintético e resumir a questão em poucas palavras. Esta é uma etapa em si mesmo muito importante: quando você define o problema, o delimita. Então a questão é “medo de ser demitido”, e apenas isso importa (a cara do chefe, dos colegas de trabalho, da família, enfim, ficam de fora neste momento).

Delimitado o problema, pergunte-se: “e se isso acontecer?”. Novamente delimite o problema e vá fazendo isso até não ter mais alternativas. Novamente você descobrirá que o resultado não é tão ruim assim. Segue abaixo um exemplo:

“MEDO DE SER DEMITIDO”
E se isso acontecer?
“FICAREI SEM DINHEIRO”
E se isso acontecer?
“VOU TER PEDIR AJUDA AOS MEUS PAIS”
E se isso acontecer?
“MEUS PAIS NÃO ME AJUDARÃO. TEREI QUE ARRUMAR OUTRO EMPREGO.”
E se isso acontecer?
“PROVAVELMENTE ARRUMAREI ALGO QUE NÃO GOSTO”
E se isso acontecer?
“POSSO TRABALHAR EM ALGO QUE NÃO GOSTO E CONTINUAR PROCURANDO.”
E se isso acontecer?
“FICAREI INSATISFEITO POR UM TEMPO MAS TEREI O DINHEIRO QUE PRECISO PARA PAGAR MINHAS CONTAS.”

No exemplo acima, fica claro que o final da história, embora não ideal, é satisfatório. Este é o objetivo – desmistificar a previsão trágica do futuro e aproximá-la mais das possibilidades reais que um indivíduo possui.

Estas são apenas algumas das técnicas de controle de ansiedade disponíveis para todos. Você não precisa ser portador de um Transtorno Ansioso para praticá-las, mas pode usá-las no dia-a-dia para ganhar mais qualidade de vida e tranquilidade no seu cotidiano.

Espero que sejam úteis! Qualquer dúvida, não hesitem em escrever: clinica.anapaula@gmail.com